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Foto do escritorPedro Alexandre da Silveira

Holdings Patrimoniais em terrenos de marinha: solução contra dores de cabeça?



holding terreno de marinha

Quem possui um imóvel no litoral sabe do incômodo que pode ser a manutenção do mesmo. Como se não bastassem os intemperismos do mar e o grande fluxo de trânsito e turistas nos períodos de temporada, muitas pessoas com negócios e/ou moradias têm que se preocupar com as obrigações decorrentes de seu imóvel estar em terrenos de marinha.

 

Mas o que são esses terrenos e como o instituto holdings pode ajudar a diminuir algumas das dificuldades provenientes deles?

 

Terrenos de marinha, também chamados “terras de marinha” ou “áreas de marinha”, são bens imóveis que pertencem à União Federal, por força do estabelecido no art. 20, VII da Constituição de 1988; que na verdade, só confirmou o que era realidade desde o período colonial.

 

Os terrenos de marinha foram criados pelo Aviso de 1818, decreto proferido ainda durante o domínio português sobre o Brasil, com a norma sendo um reflexo da reserva de propriedade sobre terras na costa que já existia desde 1672, ano no qual as salinas (ou “marinhas de sal”) foram, oficialmente,  declaradas como propriedade da Coroa de Portugal.

 

Percebe-se que a preocupação dos portugueses era, principalmente, econômica, diferentemente do que é espalhado por vários artigos e notícias, que dizem, de maneira errônea, que os terrenos de marinha surgiram com a necessidade de proteger a costa de piratas e invasões estrangeiras.

 

Na verdade, essa necessidade veio só depois dessa reserva de salinas e de maneira bem esporádica, concentrada no Rio de Janeiro, como desdobramento direto do saque à cidade feito pelos franceses em 1711.

 

Em 1831, os terrenos de marinha ganharam sua primeira disposição legal específica, estabelecendo que todos os imóveis contidos em uma zona, traçada a partir da linha da preamar daquele ano (LPM/1831) até 15 braças (ou 33 metros) no sentido do continente, pertenceriam ao governo imperial.

 

Esta disposição, incluindo sua abrangência de 33 metros e referencial de 1831, foi mantida e adotada pela república, sendo estipulado, durante a Era Vargas, que a União seria o ente federativo detentor desses imóveis; realidade que continua até hoje.

 

Obviamente, isso não quer dizer que esses bens da União não podem ser utilizados pelos particulares. Os terrenos de marinha podem ser usufruídos por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado a partir de um contrato chamado “aforamento” ou através da mera ocupação.

 

Por meio do aforamento, a União transfere o domínio útil do imóvel para o particular, que passa a poder ter o uso, fruição e gozo sobre ele; ou seja, pode realizar empreendimentos nele, da maneira como entender, dentro dos limites legais locais. Isso também significa que ele assume obrigações tributárias municipais provenientes de tal imóvel, como o pagamento do IPTU e da taxa da coleta de lixo.

 

Nessa modalidade, é devido o pagamento de dois valores: o laudêmio e o foro.

 

O laudêmio, equivalente a 5% do valor total do imóvel (excluindo-se benfeitorias), consiste em um pagamento feito à União durante o ato da transferência do domínio em si. Se este domínio já estava nas mãos de um particular no momento de transferência para outro, o primeiro deverá fazer o pagamento dele, novamente. Tal quantia corresponde sempre a 5% do valor total do terreno. Destaca-se ainda que, para a cessão do domínio ocorrer, o cedente deve estar com todas as obrigações legais em dia, devendo receber a permissão para o ato, emitida pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU).

 

O aforamento, por sua vez, é uma anualidade paga à União pelo detentor do domínio, equivalendo a 0,6% do total valor do imóvel. Seu adimplemento é essencial para a possibilidade da realização de eventual transferência, onerosa ou não, já que a falta ao cumprimento dessa obrigação pode ser motivo da SPU de impedir a transferência. Do mesmo modo, se o pagamento ficar inadimplido por três anos, a SPU poderá reconhecer a caducidade do contrato, com a cessão do domínio útil ao particular sendo revogada.

 

Já a ocupação se refere a um uso mais informal, por particulares, das terras de marinha, consistindo na instalação de empreendimento ou mesmo mera utilização mais ampla, sem a firmação de um contrato formal com a União. A ocupação é baseada em uma situação de fato, não de direito, como no caso do aforamento, gerando ao ocupante um dever de pagar à União uma “taxa de ocupação”, no valor de 3% do valor total do imóvel ou da seção dele efetivamente utilizada.

 

A lei ainda prevê uma modalidade de aquisição das áreas de marinha, pouco conhecida, mas recentemente motivada pelo governo federal, chamada “remissão”. Através dela, é possível “comprar” a parte pertencente à União e adquirir o domínio pleno do imóvel.

 

E em meio às diversas formas de utilização, como que as holdings podem contribuir com a efetividade delas?

 

Entre os vários tipos de holding existente, está a patrimonial, através da qual é estabelecida uma entidade, na forma de uma pessoa jurídica do tipo sociedade, que tem como principal objetivo fazer a administração de patrimônio pertence a uma ou mais pessoas, físicas ou jurídicas.

 

Para este fim, a titularidade do patrimônio em si é transferida para essa entidade, protegendo e preservando os indivíduos ou pessoas jurídicas por trás.

 

A partir deste conceito, é possível visualizar que uma das principais utilidades das holdings patrimoniais é a proteção das pessoas por trás dos terrenos de marinha de um dos maiores problemas relativos a essa categoria de bens: o alto grau de litigância inerente a esses imóveis.

 

Por se tratarem de bens da União, os possuidores particulares têm um grande número de obrigações a cumprir, sobretudo pecuniárias, como já dito anteriormente, de modo que é muito fácil para eles serem alvo de uma ação de cobrança movida pela União.

 

Esse perigo é ainda mais intensificado pelo fato da demarcação da LPM ser notoriamente imprecisa, com os referenciais adotados para a sua identificação sendo frequente alterados pela SPU e, muitas vezes, resultado em identificações que não correspondem àquelas que as autoridades municipais e estaduais levam em consideração.

 

Ou seja, muitas vezes é imprevisível o tamanho da parcela de um imóvel que é terreno de marinha, com uma nova demarcação feita pela SPU podendo resultar em aumento substancial nas cobranças já realizadas e muitas vezes de maneira repentina, já que os processos de localização da LPM pela União são duramente criticados pela falta de transparência e rigor científico.

 

Talvez mais arriscado ainda, em relação à litigância, seja a localização geográfica dos terrenos de marinha, que são concentrados na Zona Costeira e nas margens de rios e lagos sob a influência das marés. Esse posicionamento significa, na maioria das vezes, que as terras de marinha contêm áreas de preservação permanente (APP) dentro de si, além de outras áreas ambientalmente protegidas.

 

Ainda que sejam tomadas todas as precauções para a regularização e a prevenção contra danos ambientais em um empreendimento em um terreno de marinha com essas características, sempre há um substancial risco de alguma degradação, por menor grau que seja, ocorrer. E dessa degradação, necessariamente, surge a responsabilização dos particulares com o domínio útil da área.

 

O porquê disso está no fato da responsabilidade civil por dano ambiental ser objetiva no direito brasileiro; ou seja, em regra geral, não é necessária culpa para responsabilizar um individuo ou empresa pela degradação causada.

 

Ao colocar um holding como detentor desse domínio útil e contratante no aforamento, as pessoas por trás dela ficam protegidas das consequências patrimoniais provenientes destas ações judiciais, as quais, salvo exceções, acabarão por afetar somente a pessoa jurídica estabelecida para a administração do imóvel. Isso porque a holding assume todas as obrigações que seriam do particular e passa a responder por elas diretamente.

 

Portanto, este instituto do direito empresarial se demonstra como uma ferramenta valiosa e interessante para empreendedores, famílias e indivíduos que possuem ou pretendem possuir imóveis situados em terrenos de marinha, sendo uma resposta à altura das várias complexidades por trás deles.

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